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18 de julho de 2012

A EQUIDADE DOS COMENTADORES

Dois comentadores distinguem-se da generalidade dos sacerdotes da teologia neoliberal, que difundem contra todas as evidências o “creio porque é absurdo” ou ameaçam com pavores medievais se não se cumprirem os ditames da troika (quando as pessoas não tiverem que comer é que vão saber como é - dizia o sr. G. Lourenço). Subservientes jornalistas, fazem o papel de acólitos desta liturgia de obscurantismo.
Não há muitos pontos de contacto entre o sr.M. Rebelo de Sousa e o sr. que usa o pseudónimo de V. Polido Valente, ambos se rendem no entanto às intocáveis “inevitabilidades” neoliberais. O sr. RS, usa os seus hiperbólicos raciocínios para concluir que no essencial é assim que tem de ser, com uma técnica que segue a das partituras musicais: exposição do tema, variações, de novo o tema mas alterado e coda final ao estilo do voltairiano Pangloss, para quem apesar do terramoto em Lisboa, tudo ia pelo melhor dos mundos. O objetivo é as pessoas perderem-se nas variações para não perceberem o essencial do tema. Como dizia Lopes Graça de certos compositores: “notas a mais, para ideias a menos”.
Já o sr. PV é assertivo, porém mais que uma reflexão ideológica deveria fazer-se uma análise psicanalítica acerca das frustrações e do niilismo da classe média, que tal como a rã da fábula que queria ser boi, entregou a condução dos seus interesses à finança especuladora e ao grande capital predador e foi no conto do vigário de achar que a banca nacionalizada lhe ia ficar com as poupanças…Se as suas cabecinhas não estivessem cheias de preconceitos perceberiam o que Marx queria dizer com: expropriar os expropriadores.
O sr. PV é, pois, um exemplo da classe média que detesta a esquerda cujas verdades abalam as suas convicções e a confronta com as suas opções, despreza a social democracia do PS e se incompatibiliza com a direita que o proletariza. O seu negativismo é um recurso da sua raiva, da sua ausência de esperança e de crença no futuro, o refúgio onde curtem desenganos.
O sr. PV não parece entender as suas generalizações apressadas a partir de verdades parciais (ai a lógica, e o bom senso…) argumentando a mais das vezes com exceções, deslumbrado com os seus raciocínios, parecendo não se aperceber que não são sérios.
A propósito da recente decisão sobre a inconstitucionalidade do corte do 13º e 14º mês (Público – 08.julho) afirma que o Estado é irresponsável. Lugares comuns da ignorância são tomados como elevadas lucubrações. Deveria dizer que os governos com as suas políticas de direita têm-se mostrado irresponsáveis na defesa dos interesses nacionais, protegendo monopólios e especuladores, promovendo o capitalismo rentista e iníquos tratados da UE.
Dizer que nenhum particular “normalmente” se permite ser irresponsável, é brincar com palavras. Misturar o BNP, e outros, com o pequeno empresário ou o endividado cidadão que cedeu à chantagem neoliberal da sociedade de consumo a crédito, enquanto os lucros do desenvolvimento tecnológico e aumento da exploração eram arrecadados e postos fora do país pelos grandes capitalistas e especuladores, para intocáveis “off-shores”.
Acerca da equidade, é curioso considerar que um funcionário público e um trabalhador de “instituição privada” não são realidades comparáveis. Sem nos alongarmos a explicar em que consiste o conceito de proletariado e de exploração, algo que o neoliberalismo não reconhece – há apenas mercado onde o sr. Belmiro ou o sr. A. Santos, estão nas mesmas condições que os precários com ordenado mínimo. Em termos da globalização, também a família Wallton que dispõe 90 mil milhões de dólares está nesta teoria nas mesmas condições que os pequenos produtores ou seus empregados sujeitos à vigilância de equipas especializadas no combate ao sindicalismo. E é este o ideal que o capitalismo atual tem para oferecer às novas gerações.
Voltando aos 13º e 14º meses suprimidos. Argumenta-se quanto à falsa equidade entre público e privado, pois os trabalhadores do público têm privilégios que os demais não têm. Portanto, toca de nivelar por baixo. Privilégios só para banqueiros e administradores dedicados a bens “não transacionáveis”.
O funcionário público não pode ser despedido – falso. Há imensos precários, recorre-se por sistema à prestação de serviços externos e aos admitidos depois de 2009 aplica-se o (infame e prófascista) código laboral.
“As pessoas são promovidas independente do mérito” – seria bom que o demonstrasse. Será que todos os promovidos são incompetentes? É isso que afirma? Poderá provar ou é mera calúnia, tal como alguém dizer que todos os banqueiros e administradores são como alguns do BPP e do BPN?
“Têm sistema de saúde especial.” E depois? Corta-se no salário, para castigo?
“Acumulam vários empregos” Quem? Quantos? Cortam-se os subsídios a esses? E aos outros e aos reformados?
“Têm empregos por pressão pessoal e partidária.” Sem comentários. Além de ser um insulto para talvez 90 % ou mais dos casos, seria bom que olhasse para quem ocupa as administrações das grandes empresas desta terra. Pode consultar o livro do F. Louçã e outros “Quem são os donos de Portugal”.
É este o nível de argumentação das direitas que se consideram eruditas: a teatralidade do intriguismo político panglossiano do sr. MRS e o niilismo atrabiliário do sr VPV.
Em termos de profundidade o pensamento político-social da direita, tal como as medidas deste governo, resume-se numa palavra: mesquinhez.

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